“Fiquei chateado. Me senti muito constrangido”. O lamento é do empresário Erisvaldo Lopes dos Santos, de 47 anos, que, além de ter que lidar com a morte da companheira de 28 anos por Covid-19, uma semana após ela ter dado à luz, foi alvo de ofensas em grupos do WhatsApp, que o acusavam de levar a doença ao distrito de Trancoso, em Porto Seguro, sul da Bahia, onde mora.
Segundo Erisvaldo, as ofensas começaram em 2 de abril, no dia que ele retornou de Itapetinga, onde a companheira foi sepultada.
“Quando cheguei em Trancoso, fui na farmácia, no mercado, mas não entrei, fiquei no carro. Quem entrou foi meu filho”, contou o empresário, que é dono de uma empresa de turismo.
Ele relata que, a partir daí, moradores do distrito começaram divulgar mensagens com ofensas dirigidas a ele nos grupos do aplicativo de troca de mensagens.
“Falavam que eu era irresponsável de andar na rua sabendo que estava infectado. Aqui, todo mundo me conhece”, falou.
O problema é que Erisvaldo não está contaminado. Ele, os três filhos e as duas netas fizeram os exames, e todos testaram negativo para o coronavírus. Além disso, ele conta que, quando retornou a Trancoso, ainda não sabia que a companheira havia morrido por coronavírus.
“Quando eu cheguei, eu que entrei em contato com a coordenação de Saúde daqui e informei que minha esposa tinha morrido após sentir falta de ar. Foi feito o exame em todo mundo aqui em casa, e todo mundo testou negativo”, falou.
O único teste que deu positivo foi a da filhinha recém-nascida, que tem cerca de duas semanas de vida. Erisvaldo contou que a bebê, batizada de Alice Lopes Jesus Silva, está bem. “Não sente nada, graças a Deus”. Ele e a família seguem em quarentena, dentro de casa.
O empresário afirmou que não procurou a polícia para denunciar as ofensas, até porque está em isolamento. Contudo, ele disse que, quando viu as mensagens, gravou um vídeo explicando a situação.
Ele falou ainda que o fato de ter uma empresa de turismo fez com que as pessoas desconfiassem que alguém de fora teria passado a doença para ele.
“A gente trabalha com turismo de gente do mundo todo, e tenho que atender todos bem. Mesmo assim, meus motoristas todos fizeram exame, e ninguém deu positivo também”, afirmou.
Morte da companheira
“A filha era o sonho dela. Ela também queria muito crescer comigo na empresa”, conta Erisvaldo sobre Rafaela de Jesus Silva. Com 28 anos, ela foi a sétima paciente e a mais jovem a morrer infectada com coronavírus na Bahia.
Rafaela estava no último ano do curso de pedagogia, era professora e passava a semana na cidade de Itaju do Colônia. Aos finais de semana, ela percorria quase 280 km até o distrito de Trancoso, em Porto Seguro, para ficar com o companheiro e ajudá-lo na empresa de turismo.
Sem a esposa, Erisvaldo agora planeja a educação da filha e manter os planos que eram do casal. Por enquanto, ele conta com apoio da filha de 28 anos, fruto de outro casamento, apara ajudá-lo no cuidado com a recém-nascida.
“Ficou um pouco difícil, mas tenho que seguir pela minha princesinha. Assim que essa epidemia acabar, vou ter que levantar a cabeça e pensar no futuro”, conclui.
Por G1 BA