O início de 2020 foi de comemoração para Cristina Francisca Soares Castro, quando teve contato com as suas primeiras turmas no Grupo Escolar Reginaldo Martins Prado Junior, localizado no distrito de Pilões, na cidade de Candiba (BA), a 700 km da capital baiana. Após trabalhar por dois anos na instituição municipal como assistente e, depois, como monitora, a pedagoga começaria, enfim, a atuar como professora de Artes, seu grande desejo profissional.
Mas os planos para a nova função pedagógica foram bruscamente alterados com a determinação do fechamento das escolas por conta da pandemia. Cristina teve apenas duas semanas de contato físico com as crianças da pré-escola antes da paralisação das atividades presenciais. “Quando estava conhecendo a turma, veio o desconhecido”, conta, tentando descrever a sensação de incerteza e impotência que acometeu.
Antes da interrupção das atividades, Cristina estava conduzindo um trabalho inicial de reconhecimento. Eram propostas envolvendo identidade, que estimulavam a fala das crianças sobre quem são, quais os gostos pessoais, como são as famílias. Um momento de mapeamento e diagnóstico, que, apesar de breve, já havia alertado a educadora, por exemplo, da necessidade de atendimento fonoaudiólogo para algumas crianças, ou outros tipos de acompanhamento, como o psicológico para investigar possíveis casos de déficit de atenção.
Rompido o laço físico com a turma, a professora precisou criar metodologias para o ensino remoto, juntamente com a equipe pedagógica da escola. Além das videochamadas para quem conseguisse acesso à internet, foi combinado com pais e responsáveis que, a cada 15 dias, eles poderiam passar na instituição para retirar atividades impressas e entregar aquelas feitas na quinzena anterior. Isso foi feito o ano inteiro.
Na busca por formatos virtuais possíveis, Cristina conta que descobriu, no meio de tantas possibilidades, um caminho lúdico interessante para as aulas gravadas. Com dificuldade de aparecer no vídeo, pela timidez, ela criou uma personagem para si mesma, com um avatar no estilo desenho animado. “Não sabia que eu tinha o dom de ser youtuber!”, brinca. Nos vídeos, a professora utiliza sua voz para dar vida à figurinha animada da ‘tia Cris’ .
Turmas novas, contexto incerto
O ano letivo começou na rede municipal de Candiba no dia 1° de março, ainda com atividades remotas e sem previsão de data para a retomada presencial. Diferentemente de 2020, quando ao menos conheceu as turmas ao vivo, neste ano, Cristina não teve contato físico com nenhuma criança.
Com a situação sanitária se agravando em todo o país e na região, Cristina já entregou às famílias atividades para devolução em 1 mês, e não mais em 15 dias. A professora descreve seu planejamento com a fala intercalada por longos suspiros. “Cada semana é um desafio”, diz.
Como ela imaginava a sua programação num começo de ano letivo? Bem diferente. “Se a gente estivesse num cenário de normalidade, seria possível mudar os planos de acordo com a espontaneidade das interações das crianças. Elas poderiam estar mais livres para participar ativamente”, relata a professora.
Cristina sente também que a mediação dos familiares no processo tem reflexos decisivos na maneira como as crianças se relacionam com as atividades passadas. “A interferência é palpável e vejo isso de forma negativa. Os desenhos são pintados sempre dentro das margens, com clara indicação de um adulto. Na minha sala, elas ficavam livres para pintar como queriam”, exemplifica.
A retomada das atividades presenciais com protocolo de restrições, ainda sem definições claras na rede municipal, vai exigir dos docentes um planejamento diferente. “Teremos de refletir para elaborar novas práticas pedagógicas e pensar em outras aprendizagens”, diz Cristina. “Trabalhar, por exemplo, para orientar a importância de a criança respeitar a vez de cada um na hora de mexer em materiais compartilhados, como tinta, lápis e outros”, analisa.
Ela se preocupa muito com o futuro da aprendizagem das crianças que estão vivenciando esse período de pandemia: “A Educação Infantil é a base de tudo. Se um trabalho nesta etapa de ensino não for bem feito, as crianças, os professores e a comunidade escolar como um todo sentirão muitas dificuldades nas próximas fases, como os anos iniciais do Fundamental”.
Por RACHEL BONINO/Revista Nova Escola